Espaço que deveria servir para a ressocialização de adolescentes não cumpre papel e confina internos
Paulo de Sousa
Paulo de Sousa
Diretor do Ceduc Pitimbu, José Alberto Fonseca, admite que a estrutura é deficitária para desenvolver qualquer tipo de atividade de ressocialização . foto: Fábio Cortez/DN/D.A Press |
Adolescentes do sexo masculino com idade média entre 12 a 17 anos da Grande Natal que cometem infrações graves como assalto, homicídio, ou latrocínio (roubo seguido de morte), ou mesmo aqueles que são reincidentes em delitos menores, costumam ser internados no Centro Educacional (Ceduc) Pitimbu, em Parnamirim. A intenção é que eles venham a cumprir medida socioeducativa, com direito a aulas, atividades esportivas e mesmo cursos profissionalizantes, proporcionando sua ressocialização. Mas a situação atual da unidade é bem distante disso. Para a juíza da Vara da Infância e da Juventude de Parnamirim, Ilná Rosado Motta, o Ceduc Pitimbu "é pior do que muitas cadeias".
A equipe de O Poti/Diário de Natal acompanhou a visita da juíza Ilná Rosado na última quinta-feira ao Ceduc Pitimbu com o intuito de conferir o andamento das obras de reforma que ela havia determinado judicialmente. Nessa vistoria foi possível verificar que, por causa do atual momento de insegurança da unidade socioeducativa, apenas os núcleos de internamento estão em pleno funcionamento. A própria magistrada constatou que nenhuma atividade estava sendo desenvolvida no Centro Educacional e que os internos estavam em permanente confinamento nas celas. Inclusive, ela ressalta que na rebelião ocorrida no local no último dia 16, os jovens danificaram as grades de várias celas e que o constante confinamento tem gerado um clima de tensão entre os adolescentes. Atualmente existem 33 jovens internados na unidade, que apresenta 13 núcleos de internamento (pavilhões), sendo oito ativos.
Ilná Rosado destaca ainda que já atuou como titular de outras comarcas no Rio Grande do Norte onde existem cadeias públicas e presídios e também tem trabalhado em correições de algumas unidades prisionais do estado pelo Tribunal de Justiça do RN (TJRN). "Eu conheço de perto a situação das cadeias de Caraúbas e de Pau dos Ferros, bem como do Presídio Estadual de Caicó. Em questão de estrutura e de segurança, o Ceduc Pitimbu é muito piorque essas unidades prisionais". A própria magistrada determinou a interdição parcial da unidade devido a relatórios feitos pela Subcoordenadoria de Vigilância Sanitária do Estado (Suvisa), Corpo de Bombeiros e da Polícia Militar e entregues a ela que apontam problemas estruturais, de segurança e de alimentação graves.
Garantias previstas em lei são descumpridas
Ainda de acordo com a juíza, a unidade apresenta outras falhas que vão de encontro à nova lei que regulamenta o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). Ilná Rosado explica que a lei 12.594/2012 prevê a existência de uma equipe técnica mínima com dois psicólogos, dois assistentes sociais, um coordenador pedagógico, um advogado. "Além disso, deveria existir ainda um nutricionista para supervisionar a alimentação, uma vez que recebemos várias reclamações dos internos sobre a péssima qualidade do alimento oferecido a eles".
A magistrada diz ainda que deveriam ser desenvolvidas, conforme a lei, atividades esportivas, de cultura, lazer e de profissionalização dos adolescentes, mas nada disso tem ocorrido atualmente. "Algumas eram promovidas anteriormente, mas todas deficientes. Por exemplo, na unidade existe uma quadra de futebol improvisada, que consiste em um campo de areia com duas traves. Também era feita uma oficina de pintura por uma voluntária. Agora essas atividades estão totalmente paralisadas devido à falta de segurança, pois os funcionários não têm como retirar os internos das celas pela falta de policiamento. Aliás, vários profissionais que desenvolvem essas atividades atualmente se recusam a ir trabalhar no local por causa disso, problema que se agravou com a última rebelião". Ilná Rosado ressalta que já oficiou o Comando da PM, responsável pela guarda da unidade socioeducativa, que seja aumentado o efetivo policial no local para que as atividades sejam retomadas no Ceduc.
Incapaz
O diretor do Ceduc Pitimbu, José Alberto Fonseca, admite que a unidade apresenta uma estrutura deficitária incapaz de oferecer as condições mínimas para o desenvolvimento de atividades ressocializantes para os jovens internos. Segundo ele, o Centro Educacional sofre com a falta de estrutura física adequada; de profissionais qualificados dispostos a trabalhar ali; de atividades socioeducativas para os internos; e segurança para os funcionários.
José Alberto diz que, atualmente, o Ceduc não conta com um psicólogo,professor de informática e de serigrafia e apenas um pedagogo, quando precisaria de mais um. Além disso, apenas cinco socioeducadores trabalham ali, sendo necessários ao menos dez. As aulas aos adolescentes, no entanto, ele garante que estavam sendo ministradas normalmente até 15 dias atrás, quando a situação de insegurança provocou a paralisação de todas as atividades. Para o diretor, o Estado deveria atentar para o fato de que é preciso dar condições ao Centro Educacional para que ele preste o atendimento com eficácia. Ele ressalta ainda que o aumento do efetivo de segurança está além de suas atribuições, uma vez que é o Comando da PM que disponibiliza os policiais para o serviço de guarda.
Quanto ao policiamento, logo após o pedido de reforço por parte da juíza, o comandante da Companhia de Policiamento de Guarda (CIPGD), o capitão PM João Fonseca, afirmou que não é possível, a curto prazo, aumentar o efetivo que trabalha no Ceduc Pitimbu. "Todo o efetivo da companhia já está sobrecarregado e não temos como remanejar policiais para unidade".
Sem segurança, escola para internos está fechada
Dentro do Ceduc Pitimbu há um prédio que funciona como anexo da Escola Estadual Djalma Aranha Marinho, do conjunto Cidade Satélite, em Natal, com uma equipe de quatro professoras. Uma delas, Vanderlúcia Rebouças, explica que em tempos de normalidade, quando havia segurança, as aulas eram ministradas sem qualquer problema. São dadas aos internos aulas do ensino fundamental, cumprindo os 200 dias letivos no ano, somente pelo horário da manhã. "Mas não cumprimos as 800 horas/aula porque não tem como juntar todos os 33 internos em uma só sala, já que há bastante rixas entre eles".
Já a professora Rosângela Lima reclama da falta de condições de trabalho. Segundo ela, os problemas começam com o deslocamento até a unidade, pois o veículo que faz o transporte dos professores é tão precário que "se chover, é preciso a gente abrir o guarda-chuva para não se molhar". Além disso, ela conta que a sala de informática existente no Ceduc está desativada, inclusive sem mais nenhum computador. Também não há biblioteca na unidade para os jovens. "O que fazemos é dar uma educação básica mesmo".
Outra professora, Fátima Canduí, lamenta a falta de estrutura, pois, segundo ela, a aula é o único momento em que os internos conseguem se concentrar e ficar calmos. "Se tem um lugar em que eles se comportam é na sala de aula, pois é a única atividade que eles ainda têm. Ou é isso ou ficar enclausurado".
O presidente da Fundação Estadual da Criança e do Adolescente, Getúlio Batista, responsável pela administração dos Ceducs do RN, admite que o serviço de ressocialização dos internos do Ceduc Pitimbu está parado, por enquanto, devido aos seus problemas estruturais. Contudo, ele ressalta que o governo do Estado já liberou recursos para uma ampla reforma na unidade. O projeto prevê a construção de quadras de basquete e vôlei, de uma piscina olímpica e de um campo de futebol. Além disso, ele afirma estar buscando convênios para que sejam retomadas as oficinas profissionalizantes. A perspectiva é de que essas obras sejam concluídas em cerca de umano e meio. "Então a realidade do Ceduc será completamente diferente".
Fonte: http://www.diariodenatal.com.br
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